sábado, 27 de fevereiro de 2010

Na pele do Ator

Um texto que já na primeira leitura gostei (e isso é bem raro de acontecer) vassoura atrás da porta, ou, como prefiro e não escondo, quarto número nada, meu título predileto, tem sido um dos processos mais instigantes, interessantes e enriquecedores que já tive o privilégio de participar. Primeiro de tudo, acredito no texto. Reconheço que se trata de uma obra divertida e surpreendentemente madura para um autor tão jovem.

Assumo que sinto prazer em participar daquilo que gosto. Embora não possa negar as dores que todo o processo me causou. E quando falo em dores não me refiro apenas àquelas psicológicas que todo o processo causa, mas pelo fato de meu personagem não ter os braços e isso me causar desconfortos enormes de adaptação. Mas todo o incômodo foi bastante desafiador e valeu muito à pena. Coloquei-me numa perspectiva diferente da habitual que me fez ter necessidade de repensar muito as minhas posturas de ator, e porque não dizer, de ser humano. É impossível separar completamente as minhas vivências pessoais do meu trabalho de ator.

A vida é a matéria prima do teatro. Teatro trata de tudo que é inerente ao ser humano. Na vida, cedo ou tarde, percebemos sua complexidade. Ora é cheia de realizações, esfuziante... Ora trágica, perversa, estranha. E é um pouco desse estranhamento que eu espero que o público perceba. Espero que cada riso, ou provável lágrima, seja motivo para uma futura reflexão. Porque cada emoção que tive (e tenho) como esse processo me leva a perguntas sem respostas garantidas. Mas, inquietantemente necessárias. Como por exemplo, o que fazer na iminência da morte? Como agir na inevitável solidão? Ou talvez questões mais simples: Será que somos capazes de perceber as necessidades dos outros? Não posso deixar de sentir um aperto no peito ao pensar que muitos P2 estão por aí, resistindo sem esperança, vitimados pela conseqüência pura de simplesmente existirem.

Para finalizar, quero dizer que esse espetáculo significa a minha entrada com o pé direito em 2010. Acho que trará sorte começar o ano fazendo o que gosto. Agradeço muito a todo o apoio que sempre tive. Em especial, à minha mãe, que é a minha maior incentivadora nos momentos de descrença com a vida e arte, e a toda minha família e amigos. Descubro a cada dia que tenho muita fé no futuro, no trabalho e no respeito que somos capazes de desenvolver uns pelos outros.

A alma não é só o que me resta. Nunca poderei parafrasear o meu personagem. Confirmo aliviado que “Arte não é falta do que fazer” e que graças a todos que estão ao meu redor, resta muita coisa...

Fernando Campos (Ator da Companhia)


sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Atrás da Porta



“Vassoura atrás da Porta ou Quarto Número nada”, me fez rever certas “posturas enraizadas” e minha essência. Venho de uma longa trajetória em busca de um conhecimento interior, nessa trajetória, estudei a mim mesmo, e, principalmente, os outros.

Tive oportunidades de, como ator, explorar várias facetas do ser humano: dor, alegria, tristeza, loucura, solidão, medo, prazer, tortura... Etc. Toda essa gama de sentimentos e mundos, tornaram o que sou hoje: um ser amplo, complexo e em eterna transformação. Sempre acho que nada mais vai abalar minhas estruturas... Nessas horas, tenho raiva de minha ingenuidade.

Quando fui convidado a fazer esse espetáculo, aceitei por ser um texto com grandes sutilizas, mas não imaginaria nunca, o que iria acontecer durante os ensaios. Esse texto mexeu muito com minhas estruturas, pois, deparei-me com o mundo do Teatro do Absurdo (diga-se de passagem, que eu amo), que traz quatro personagens surpreendentes.

A minha personagem permeia entre a loucura e a sanidade; o conformismo e a vontade de viver, e, principalmente, entre a rabugentice, e o humor. Um ser totalmente antagônico. Foi nesse momento que fiquei ciente que minhas “posturas enraizadas” teriam que desfazer-se. Sofri... Entrei em desespero, porque me deparei com uma personagem extremamente complexa e que teria que montá-la em pouco mais de um mês. Tarefa árdua, mas que estou amando de verdade, afinal, o que seria dos atores sem os grandes desafios.

O resultado será julgado pelo público, porém, já fico contente por mais uma vez, o teatro ter bagunçado a minha cabeça e a minha vida. Amo a minha arte e sem ela não sou nada. Uma coisa que tenho certeza, eu, Lucas Bertolucci, estarei atrás da porta, torcendo, aplaudindo, incentivando e mandando energias para um tal personagem que conquistou meu coração... Um acara chamado P1.



Por Lucas Bertolucci (Ator da Companhia.)

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Lamentos de uma atriz...

Não explicaram muito bem a questão dos processos para o espetáculo. Venho esclarecer melhor. O texto é um olhar intenso sobre a vida de dois pacientes abandonados num quarto de hospital público. Um quarto número nada. Um quarto que as pessoas parecem ignorar. Uma atitude típica de nosso país onde todos preferem fingir que não vêem. Onde os vidros dos carros se fecham ao se detectar a presença de meninos de rua. Onde as maiores injustiças são admitidas por uma população passiva que prima por ser inconsciente. Agora, enquanto escrevo esse texto, ouço na televisão a notícia de que uma mulher, idosa, morreu no posto médico público após 24 horas à espera de uma UTI. Fico profundamente comovida e revoltada.


 
Diante disso, acho que as nossas enfermeiras displicentes e perversas não afastam em nada da realidade. Aliás, o que estará imitando o quê? Mas será esse um problema só brasileiro?Quando vejo as barbáries que acontecem pelo mundo me pergunto: Quem se responsabiliza pelo outro hoje em dia? Quem cumpre o dever básico de ser competente naquilo a que se propõe? Esses, entre outros, foram os questionamentos que o texto me trouxe.


 
Para chegar até aqui tive que lutar contra a minha confortável ação de trabalhar em cima do óbvio e depois ir para casa com a falsa sensação de dever cumprido. Mas eu não quero apenas me sentir confortável. Quero mergulhar fundo, colocar o dedo na ferida. Mesmo que para isso tenha que sair de alguns ensaios pensando seriamente e desistir de ser atriz. Forçando-me ao exercício cada vez mais em desuso de pensar.


 
Como confidenciei ao grupo certa vez, estava sendo muito complicado lidar com a energia do espetáculo. Por ter que mergulhar num ambiente tão pesado como o hospitalar, foi um começo muito sofrido. Ouvir as falas dos personagens tinha efeito direto sobre mim, pois convivo há muitos anos com a doença de um ente muito querido. O mais difícil, certamente, foi ter que me deparar com tanto sofrimento e não me envolver, já que a minha personagem é alheia a tudo isso. Mas o processo, que sempre é caótico no começo, nos ajuda a achar soluções para o que parece ser incontornável. E a cada leitura fui encontrando a minha enfermeira 2, fui me surpreendendo com o que ela era capaz de fazer. Isso me deu um prazer incomensurável e me fez pensar muito, como uma jovem atriz que sabe que tem muito que aprender, e que não posso deixar de me encantar sempre ao perceber o quanto é vasto o universo do ator. Posso afirmar, sem sombra de dúvidas, que o espetáculo contribuiu e tem contribuído muito para a minha melhora como atriz e ser humano. Tenho até a pretensão de esperar que esse espetáculo venha a contribuir para a melhora de vocês.

 Por Mabelle Magalhães
(Atriz e Co-Fundadora da Companhia)

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A porta está aberta e o som ligado: O revelar do processo.

O processo de criação pode ser a partir de qualquer coisa é comum que seja pelo texto, começamos pela leitura do texto, mas não me valho apenas dele, nem das improvisações, memória corporal, vivências pessoais, histórias que ouço por aí, eu preciso de música! Então eu convido os leitores do blog para entrarem neste universo sonoro.
Como assistente de direção a minha forma de entrar na atmosfera da peça foi a identificação com algumas músicas para serem trabalhadas nos ensaios.

Em P1 e P2 eu via duas pessoas brigando o tempo todo, mas abandonados a eles mesmos, rabugentos, engraçados, naquele momento eram amigos de infância!

Trabalhei a música Meu amigo Pedro de Raul Seixas com Fernando e Lucas para criação de vínculos entre P1 e P2, as diferenças, mas o companheirismo.

O começo da música sempre me lembra como uma caminhada de mãos dadas, olha que imaginação é algo muito pessoal, cada um cria suas imagens, mas vamos lá.

“Quando quer chorar vai ao banheiro” eu achei a cara de P2, durão. “Me queimo torto no inferno” P1, ah ele é artista! Risos

“Hoje eu te chamo de careta e você me chama vagabundo”, me parece P1 falando sobre P2, um careta e o outro é vagabundo, pois no texto P2 pergunta a P1 o que ele faz, ele diz nada e P2 diz que como P1 é artista ele deve propor, criar... Mas então estou com P1, é isso que é arte? Materializar coisas?

E P1 assim como na música meu amigo Pedro pede a P2 que não o critique, deixe ele ser como ele é.

Quando no refrão diz “Pedro onde você vai eu também vou, mas tudo acaba onde começou” eu ficava vendo os dois atores ali deitados e via os dois personagens brigando mas com carinho, mas aonde eles vão eu não posso dizer, se não estraga a brincadeira.


Para a Enfermeira 1 eu escolhi duas músicas, Dr. Pacheco de Raul Seixas e Histérica de Oswaldo Montenegro.

A imagem que crio de Dr. Pacheco é de um psiquiatra estilo cientista maluco de desenho animado e a enfermeira 1 seria a versão feminina daquela criaturinha louca, paranóica, olhos esbugalhados, andar estranho, uma mistura desequilibrada de energia e cansaço.

Quando nos versos da música se encontra

“Formado, reformado, engomado
Num sorriso fabricado
Pela escola da ilusão,
...
Perdido, dividido, dirigido,
Carcomido e iludido
...
Dr. Pacheco não vai voltar
Dr. Pacheco foi almoçar”

Lembro dela, pelas próprias falas dela, ela foi formada e dirigida para ser assim, dura, e que escola é essa onde se ensina ilusões e pensando na minha faculdade me pergunto qual escola não ensina ilusões?
A personagem é dividida entre as várias tarefas que tem de cumprir e ela de certa forma abandonará os pacientes, vamos dizer que ela não vai voltar porque foi almoçar. Mas é nessa hora que ela fala de suas “divisões” e bom, que mulher não é dividida entre profissão, marido, filhos e menstruação? Nessa hora ela é a histérica de Oswaldo Montenegro.

A música do Oswaldo começa com vidros sendo quebrados, tiros e um grito! Nossa!! Assim é a entrada da Enfermeira 1, uma histérica controlada, (controlada até quando?), afinal está num hospital, mas dá para ver na entrada da personagem pelos seus olhos arregalados, pelo andar apressado, ela vai explodir! Saiam de perto!

 
A Enfermeira 2 eu peguei bem do texto mesmo, bem diferente da riquíssima construção de Mabelle, imaginava uma pessoa que expõe produtos, no caso dela, expõe informações, não importando se serão interessantes, mas de um jeito encantador, sensual, alegre como se fosse a melhor coisa do mundo, algo meio garota do tempo, meio modelo, que não importa o conteúdo do que é dito, mas sim o jeito que é mostrado, me lembrei na hora da música Das Modell, tanto na versão tecno industrial da banda Kraftwerk quanto na versão rock industrial da banda alemã Rammstein.

Como nos dois casos a música está em alemão (há uma versão em inglês também) e mesmo sabendo a tradução me valho mais da imagem dos clips e do ritmo. No caso de Kraftwerk lembra mesmo um desfilar, meio robotizado, meio quebrado para as poses.

Das model – versão Kraftwerk
“Ela é tão bela, por sua beleza nós pagaremos
Ela posa para produtos de consumo de vez em quando
Para toda câmera ela dá o melhor de si”

Essa questão de dar o melhor de si, é o que a personagem faz, dá o melhor de si, sempre tenta ser agradável, sempre diz “espero ter contribuído para a melhora de vocês”, ela deseja ser simpática, solícita, ajudar, mas aí é que está ela realmente ajuda? E porque ela ajuda, para que “câmera”? É uma pose? Uma ironia?
Outra música que foi utilizada para a personagem enfermeira 2 foi Ai se eles me pegarem agora, música de Ópera do malandro de Chico Buarque, utilizada para a construção da sua forma de andar.

Agora ouço a música de abertura da peça, a primeira a ser escolhida e a que me comove a qual eu não citarei, somente assistindo ao espetáculo para entender porque ela foi escolhida, ou não entender mais ver como ela inicia, adentra quem a ouve na atmosfera de sentimentos do que será exposto.

Mas uma música que utilizamos pouquíssimo e a que mais gosto é L’amitié de Françoise Hardy, porque me lembra a questão de que a única coisa que resta a P1 e P2 é a amizade deles.



“Como não sabemos o que a vida nos dá,

Talvez eu não seja mais ninguém.

Se me resta um amigo que realmente me compreenda,

Me esquecerei das lágrimas e penas.”


Links para vídeos de algumas músicas:

L’amitie


http://www.youtube.com/watch?v=MXWfb1PpmbQ&feature=related

Das Modell

http://www.youtube.com/watch?v=wWc4a5B9AUI&feature=related

Meu amigo Pedro

http://www.youtube.com/watch?v=llcFzl3uauk

Dr. Pacheco

http://www.youtube.com/watch?v=WlM52IE_Jrk&feature=related


Diana Paiva
Assistente de Direção

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

CARAS... CARICATAS

Contamos com o trabalho da Atriz, Arte-Educadora e Artista Plástica Priscila Pimentel, com essas caricaturas de toda a equipe, que ajuda a trazer um pouco da atmosfera do espetáculo. Sobretudo, o espírito clownesco, característico dos procedimentos dramatúrgicos do Teatro do Absurdo. Destaque para Ionesco, que, ao meu ver, traz com maior força a comicidade. Um traço que está sendo desenhado em nosso espetáculo - a quebra com um riso desconsertante. O que muitos chama de "humor negro".

Cada escolha, quase que milimétrica, vai dando esse contorno de leveza e profundidade ao espetáclo. Uma mistura de dor e alegria, inocência e pervercidade, vazio e turbilhão de sentimentos. Somos bem contemplados com os desenhos de Priscila Pimentel, também por representar o que não queremos mostrar, mas que é bem explícito - nossos defeitos. Claro que de uma maneira exacerbada, nos desenhos, mas no di-a-dia, são suprimidos por falsas ilusões de nosso caráter (sendo bem redundante.)

Acabaram conhecendo mais um pedacinho desse quebra cabeça desembaralhado!




Diretor e Dramaturgo
Tássio Ferreira

Co-Diretora
Edivânia Lima
Assist. de Direção
Diana Paiva


Ator
Lucas Bertolucci

Atriz
Mabelle Magalhães


Ator
Fernando Campos


Atriz
Edivânia Lima

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

A Todo Vapor...

Diz-se que em Salvador, o ano começa pós-carnaval. De fato, parece que isso acontece, sobretudo no Teatro. Temos poucas produções nesse período conhecido por férias - de janeiro a fevereiro. Com isso, sofrem os espetáculos que se lançam nesse período, sofrem as companhias (nosso caso) que buscam apoio de empresas para estrear espetáculos em pós-carnaval (nosso caso), que recebem desculpas diárias de "tal diretor de marketing" estar de férias, ou: "não podemos apoiar nesse período, ligue depois do carnaval".
A coisa se não é caótica, está beirando o próprio caos. Mas, como somos ousados, metemos a cara e damos seguimento aos nossos projetos. Vassoura vai sair! Rr.
Já podemos dizer que esse ano será de grande temporada para o espetáculo, ou de pequenas temporadas que juntas, deixam o espetáculo em cartaz por algum tempo.
Aí vai nossa programação de 2010...

Março em cartaz: Café Teatro Zélia Gattai - Pelourinho
Quando: Quartas-Feiras (exceto dia 03)
Horário: 19h
Ingressos: R$ 10,00 inteira e R$5,00 meia.


Abril em cartaz: Teatro Raul Seixas - Sindicato dos Bancários
Quando: Sábados
Horário: 20h
Ingressos: R$ 10,00 inteira e R$5,00 meia.

Maio: Estamos fechando temporada
Junho em cartaz: Teatro Gamboa Nova - Largo dos Aflitos
Quanto: Provavelmente sextas e sábados
Horário: 20h
Ingressos: R$5,00

A idéia é de um espetáculo que possa ser adaptado a qualquer espaço, não limitado a caixa cênica italiana. Daí, nosso projeto contempla apresentações em faculdades, para suscitar questionamentos diversos nos cursos de letras e enfermagem. Letras, levantado questões do uso da linguagem na contemporaneidade, alé de construções em dramaturgia e dos procedimentos dramatúrgicos do Teatro do Absurdo. Em enfermagem, se pode discutir questões de ética e moral dentro de um hospital ou clínica. Além de procedimentos que as personagens executam no espetáculo, e contrapor com a realidade não ficcional.