quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Hedônicos, Por quê?


Depois de muitas discussões, pesquisas diversas para a escolha do nome de nossa Companhia, surgiu então a palavra 'Hedônicos'. Este nome não tão conhecido foi suscitado pela atriz Anne Costa; numa tentativa de representar a essência dessa Cia. que completará um ano no dia 28 de agosto, acabamos acatando a sugestão.

A palavra criada por Anne (Hedônicos) vem do grego "HEDONE" que significa prazer. Trata-se de uma teoria ou doutrina filosófico-moral (chamada de hedonismo) que afirma ser o prazer individual e imediato o supremo bem da vida humana. Surgiu na Grécia, na época pós-Socrática, e um dos maiores defensores da doutrina foi Aristipo de Cirene, discípulo de Sócrates, no século V antes de Cristo. Porém esse conceito genérico do 'prazer' apenas, não é suficiente para explicá-lo de forma completa. Isso ocorre porque o significado de prazer pode e deve ser desdobrado, dilatado a outras tantas formas. O que é prazer afinal? Genericamente pode-se dizer que tudo aquilo que é bom, dá prazer. Mas seria apenas isso?



Numa linguagem mais simples, poderia dizer também que o hedonismo é a arte de ser, não a de ter. A arte de ser é a sabedoria ascética do despojamento: não se cobrir de honras, de dinheiro, de riquezas, de poder, de glória e outros valores ou virtudes, mas preferir a liberdade, a autonomia, à independência. A escultura de si é a arte dessa técnica de construção do ser como uma singularidade livre. O Hedonismo não é a mesma coisa que consumismo, é exatamente o oposto. É o antídoto. O consumismo é o hedonismo liberal e capitalista que afirma ser a felicidade a posse de bens materiais.

Para Epicuro, o maior expoente dessa doutrina filosófica, felicidade é prazer, basicamente satisfação desses desejos físicos. Mas, como a um prazer momentâneo pode-se seguir desprazer ou dor, convém procurar um tipo de satisfação estável, comedido, mas constante - algo como a sensação que experimenta um homem que não sente sede e, por isso, não bebe. Esse "prazer em repouso", como denomina Epicuro, é precisamente a ataraxia, um estado de desejo sempre saciado e que se consegue pelo perfeito equilíbrio entre as partes do organismo. Toda concepção filosófica de Epicuro relaciona-se a quatro máximas ou medicinais: "Não há que temer a Deus", "Morte significa ausência de dor", "É fácil procurar o bem", "É fácil suportar o mal".

Na sociedade atual podemos perceber que o prazer que é sempre buscado é o prazer imediato, aquele que não necessita de nenhum esforço para ser conseguido, que satisfaz de forma rápida. Seria o prazer sexual, o prazer de ter sempre aquilo que se deseja sempre, o prazer do estômago abarrotado, o prazer do repouso longo, o prazer do vício. Então, pela teoria hedonista, a problemática humana estaria resolvida no sentido de doar-se de forma integral a esses prazeres, encarcerando-se os homens na jaula das sensações.

Porém, o que vemos é que essa forma de vida não trouxe ao homem a felicidade que a filosofia hedonista pregava. Os prazeres aos quais se entrega geralmente têm duração curta e, quando se exaurem, criam-se anseios por atingir um patamar mais elevado desse prazer. Com isso, há uma entrega total e irrestrita a sensação que causa prazer, só que essa busca se revela nula, pois não se consegue atingir a felicidade almejada, pois esses prazeres apenas criam vontade de sentir algo mais que aquele prazer não pode dar. Com isso, o homem cai em comportamentos depressivos e neurotizantes que lhes destrói a vida e todas as aspirações de progresso, já que busca algo que não existe.


Então, onde está a felicidade proporcionada pelo prazer que o hedonismo prega? Simples. O prazer não se resume apenas as manifestações fisiológicas, efêmeras que não planificam. O prazer se encontra na emoção profunda do ser. A emoção que alguém sente ao ler o lindo Soneto da Fidelidade, do grande Vinícius de Morais. A boa sensação de ler uma peça de Jorge Andrade, com todas as emoções que suscitam na gente. Assistir um bom espetáculo teatral, ainda que esse conceito de bom seja relativo. E o prazer sentido em ajudar alguém, em ver alguém que gostamos muito galgando os degraus altos do sucesso, o prazer de ver alguém que amamos chegar perto de nós. E quantos outros poderia citar!


Na verdade, toda essa explicação acerca do hedonismo não foi a real atitude para a escolha do nome pela atriz. Somos de fato um grupo que se entrega em todos os processos teatrais, tentando extrai deles o máximo possível para o crescimento enquanto atores e seres humanos. Sem falar do real PRAZER em atuar. Não somos adeptos dessa corrente hedonista que já sofreu e continuará sofrendo inúmeras deturpações como vocês puderam conferir anteriormente. Sou pessoas de teatro, que pelo prazer em atuar, seja como ator, seja como diretor, cenógrafo, enfim, não importando a maneira da atuação, queremos fazer Teatro. Daí somos Hedônicos quando amamos nossa arte de representar as múltiplas faces humanas, com objetivo de despertar o sensível e com isso levar a questionamento de si e desse espaço ao qual estamos inseridos, com toda sua complexidade. E você, tem prazer no que faz?



Tássio Ferreira (Diretor da Companhia)